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O FRACASSO DA MORALIDADE CRISTÃ

por Richard Carrier

A afirmação de que as pessoas só podem ser motivadas a serem morais por ameaças ou promessas de inferno ou paraíso (ou por qualquer outra alegação inverificável) na verdade implode a moralidade. Com efeito, de um modo triplo. Primeiro, ela permite que sistemas morais falsos proliferem e sejam adotados como verdadeiros, vinculando essas moralidades falsas às mesmas promessas e ameaças. É exatamente isso o que observamos. Supostamente, apenas um sistema moral pode ser verdadeiro, embora centenas de sistemas morais estejam vinculados exatamente à estas mesmas promessas.[12] Assim, por uma questão estatística, estas mesmas promessas são utilizadas muito mais para amparar falsas moralidades do que moralidades verdadeiras. E isso, segundo as regras de mensuração do êxito e do fracasso, é o pior desempenho que qualquer método poderia almejar. Portanto, o Cristianismo é maximamente fracassado na promoção da verdadeira moralidade. Somente se pudermos verificar a conexão entre uma moralidade e seus efeitos prometidos seremos capazes de descobrir a verdadeira moralidade. O Cristianismo não oferece nenhum meio confiável de fazer isso.

Segundo, exatamente porque a veracidade destas promessas não pode ser confirmada, elas não podem proporcionar nenhuma motivação real para ninguém. E mais uma vez as evidências mostram que de fato elas não o fazem, já que os crentes são tão imorais quanto os descrentes. Não há nenhuma prova de que o aperfeiçoamento  pessoal promovido pelo Cristianismo seja superior ao de qualquer outra filosofia humana e racional: vinculando a moralidade a promessas inverificáveis, o progresso moral se torna impossível, porque as pessoas não estão aprendendo as verdadeiras razões pelas quais deveriam ser morais, mas em vez disso elas acomodam-se às razões erradas para serem morais – nunca aprendendo a verdade, porque nunca procuram por ela, porque elas pensam equivocadamente que já a possuem (e  a maioria dos filósofos seculares caíram exatamente na mesma armadilha). Desse modo, o Cristianismo se torna mais eficaz em promover e sustentar várias formas de imoralidade do que de moralidade. A malignidade do Nazismo é o exemplo mais notório, que Hector Avalos demonstrou além de qualquer dúvida razoável ser um produto do Cristianismo.[13] Mas a América possui seu próprio pesadelo a assombrar-lhe a consciência, o apoio cristão ao sistema escravagista americano por mais de duzentos anos.

Pior ainda, as formas ingênuas de motivação moral cristã – ameaças vazias de tormentos no inferno e o suborno do paraíso – atrofiam o amadurecimento moral, assegurando que os crentes permaneçam emocionalmente infantis sem jamais alcançar o desenvolvimento cognitivo moral de verdadeiros adultos. Os psicólogos estabeleceram que adultos morais são morais não em virtude de ameaças vazias ou subornos (esse estágio do desenvolvimento moral é típico de crianças, não de adultos), mas porque elas se importam com o efeito que seu comportamento tem sobre si próprios e sobre os outros, encontrando sua recompensa (e sua punição) exatamente nessa realização. Em outras palavras, adultos maduros são bons porque são boas pessoas.[14] E assim sendo, elas não precisam de religião para convence-las a serem boas. Ser boas pessoas é o que elas já desejam ser. Em contraste, o Cristianismo ingênuo é um veículo perfeito para manipular massas de pessoas rumo a qualquer fim perverso para o qual um propósito cristão possa ser concebido. O Holocausto, a Inquisição, a escravidão anterior à Guerra Civil Americana e o genocídio dos índios americanos são os exemplos mais notórios. Mas a guerra (de qualquer tipo) é o exemplo mais comum, assim como (atualmente) o uso do Cristianismo para voltar o povo americano contra a ajuda aos pobres e torna-los favoráveis à promoção de políticas libertinas dos ricos (uma deturpação mais flagrante dos ensinamentos de Cristo dificilmente pode ser concebida, embora seja bem sucedida mesmo assim).[15]

Portanto, o Cristianismo fracassa como um fundamento para os valores morais, tanto na teoria como na prática.[16] Que tantos filósofos seculares tenham incorrido exatamente nos mesmos erros apenas prova meu ponto de que devemos parar de cometer esses erros e em vez disso atentarmos para os verdadeiros fatos do mundo. A verdadeira moralidade deve ser fundamentada em fatos empiricamente verificáveis. E a ciência por si só fornece o mais confiável método para determinar fatos empiricamente verificáveis.

Notas.

12. Isto é inerentemente óbvio para qualquer observador esclarecido do Cristianismo moderno (e de sua história), bem como de todas as outras religiões (que empregam exatamente as mesmas promessas e ameaças para fundamentar suas próprias moralidades), mas no caso do Cristianismo isto é suficientemente provado por diversos capítulos de The Christian Delusion combinados: David Eller, “The Cultures of Christianities,” 25–46, e “Christianity Does Not Provide the Basis for Morality,” 347–67; John Loftus, “What We’ve Got Here Is a Failure to Communicate,” 181–206; e Hector Avalos, “Yahweh Is a Moral Monster,” 209–36 (veja Richard Carrier, “The Will of God” em http://sites.google.com/site/thechristiandelusion/Home/the-will-of-god).

13. Hector Avalos, O Ateísmo Não Foi A Causa Do Holocausto.

14. Veja, por exemplo: Monika Keller, Wolfgang Edelstein, Christine Schmid, Fuxi Fang, Ge Fang, ““Reasoning about Responsibilities and Obligations in Close Relationships: A Comparison across Two Cultures,” Developmental Psychology 34, no. 4 (1998): 731–41; Nancy Eisenberg, Klaus Boehnke, Petra Schuler, Rainer K. Silbereisen, “The Development of Prosocial Behavior and Cognitions in German Children,” Journal of Cross-Cultural Psychology 16, no. 1 (Março de 1985): 69–82; e fontes e discussões em Sinnott-Armstrong, Moral Psychology, 3:297–370. Que teorias morais centradas no inferno na verdade se correlacionam com disfunções sociais, veja Gary Jensen, “Religious Cosmologies and Homicide Rates among Nations: A Closer Look,” Journal of Religion and Society 8 (2006): http://moses.creighton.edu/JRS/2006/2006–7.html.

15. Isto é satirizado de maneira irreverente porém acurada em “The Gospel Of Supply Side Jesus” em Al Franken, Lies and the Lying Liars Who Tell Them: A Fair and Balanced Look at the Right (New York: Dutton, 2003), 313–23 (cf. 213–16).  Alguns cristãos devotos proeminentes (incluindo católicos e evangélicos) documentaram os mesmos fatos com pesar: Ronald Sider, The Scandal of the Evangelical Conscience (Grand Rapids, MI: Baker, 2005); Garry Wills, What Jesus Meant (New York: Viking, 2006); Gregory Boyd, The Myth of a Christian Nation (Grand Rapids, MI: Zondervan, 2007); e Robin Meyers, Why the Christian Right Is Wrong (San Francisco: Jossey-Bass, 2008).

16. Outros aspectos em que o Cristianismo prejudica o progresso moral incluem suas doutrinas centrais de que o seres humanos são inerentemente pecaminosos e portanto incapazes de sua própria reforma moral (portanto nada que eles façam por si próprios irá torna-los pessoas melhores) e que através de uma mera confissão de fé eles serão perdoados de todos os crimes não importa quais sejam (negando assim todos os incentivos morais que o Cristianismo supostamente forneceu em primeiro lugar): veja Evan Fales, “Satanic Verses: Moral Chaos in Holy Writ,” em Divine Evil? The Moral Character of the God of Abraham, ed. Michael Bergmann, Michael Murray, e Michael Rea (Oxford: Oxford University Press, 2011).

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